Bem, acho que não preciso perder tempo dizendo que, em tempos de Vingadores e Liga da Justiça rolando nos cinemas aos montes, o herói de infância de boa parte, talvez aquele que mais tenhamos ajudado, seja na torcida ou erguendo as mãos, é o Goku. 

Sim, cara. Puxa na memória. O nosso herói da infância e de boa parte da adolescência é aquele da nuvem voadora e tudo! Ou vai me dizer que a batalha em Namek entre Goku e Freeza não foi o ápice da sua infância e adolescência?

Mas, vem cá, depois de crescido e maratonando séries e filmes, já parou para pensar em como esse personagem tem tamanho magnetismo com o público?

Nesse ponto é onde sacamos como o seu Akira Toriyama soube trabalhar o protagonismo do Goku em uma fase da série em que ele dividiria a tela com dezenas de novos personagens.

Dragon Ball e Dragon Ball Z

A história de DB é teoricamente simples e bastante linear: buscar as sete esferas do dragão perdidas ao redor do mundo que, quando reunidas, invoca um dragão que realiza três desejos.

Corta para a Bulma encontrando o Goku pela primeira vez. Aqui a gente vai acompanhar os dois em busca das esferas. Sim, parece que não, mas DB se trata de um grande road movie (aqueles filmes onde os protagonistas estão sempre na estrada. Pra não fugir da temática herói, pensa em Logan como um filme desse tipo).

Claro que, como todo bom filme dessa temática, somos apresentados a vários personagens: Yamcha, Kuririn, Mestre Kame, Pilaf, a Organização Red Ribbon, Tenshinhan, Piccolo e por aí vai.

Com vocês, Dragon Ball. Quem diria que daí sairia o SuperSayajin Fase 3, não é mesmo?

Basicamente, nesse ponto, temos a jornada do garotinho ingênuo que saiu do campo para rodar o mundo inteiro, criando novas amizades, vencendo inimigos e coroando toda sua história com uma vitória no principal torneio de artes marciais do mundo.

Pulamos para DBZ e em tudo que rodeou o nome e as intenções do autor.

A tônica de DBZ, por mais que as esferas estejam presentes, muda um pouco. Claro, as esferas estão ali, mas elas não são mais o fim. Elas são o meio, o pretexto para o que o autor nos mostraria.

E aqui nessa nova fase somos apresentados a família de Goku. Sim, agora nosso protagonista é pai e, além disso, até o final da Saga do Freeza, descobrimos não só isso, mas a sua origem naquela nave espacial lá do começo de DB. Trata-se de uma descoberta, tanto para gente quanto para o nosso herói.

Nesse ponto, o Akira Toriyama nos refresca com novas percepções acerca de seu protagonista. Como temos algo a descobrir nessa nova fase (a origem do personagem), o Goku ganhou mais uma camada: a sensação de novo, de novidade, faz com que a gente se estimule para acompanhá-lo com o mesmo afinco que fizemos por toda a sua jornada em DB.

Agora é o Goku adulto. O Goku pai. O Goku que também descobriu que tem um irmão. O Goku que soube sobre seu passado e agora busca entender quem é. Bem mais maduro e diferente do que aquele garotinho do campo, não é mesmo? Ponto para o seu Toriyama em atribuir novas camadas para o personagem, sem abrir mão da sua essência.

Gohan, Raditz, e o desenho está mais “sério”

Tenho certeza  que a primeira coisa que a gente pensa quando assiste DBZ é que “a porra ficou séria”. E, de fato, ficou. Esqueça o road movie (tá, eu sei que eles vão para OUTRO PLANETA, mas não é essa a questão, calma) e a escala global que as esferas proporcionam.

Os desafios, por mais que a ameaça seja a destruição do mundo, são mais intimistas. Eles se referem mais ao personagem do que o mundo em si.

E por conta disso, quase que simultaneamente, somos apresentados a dois novos integrantes da família do Goku: seu filho Gohan e seu irmão Raditz.

Bem, Gohan é tratado como o potencial, aquele que superará o pai (e superou até o Cell. Finge que o Gohan acabou aí, é melhor), o protagonista dessa nova fase (que por certo tempo, acabou sendo), o Luke Skywalker e todas as analogias possíveis de que o Goku passará o bastão para o filho.

Raditz é a invertida na situação, é aquela camada, o frescor que a saga precisava. Como assim, irmão? Que negócio é esse do Goku, aquele que sempre salvou o mundo em DB, ter tido como missão, justamente destrui-lo? Que diabos é Sayajin e Kakaroto que o Raditz tanto fala?

E, caramba, mesmo lutando junto ao Piccolo, como assim O GOKU MORREU?

Goku, aquele que está sempre atrasado

Akira Toriyama não se cansou de jogar elementos novos na nossa cara. A cada novo episódio de DBZ, por mais que tenhamos novos personagens (com potenciais protagonistas) aparecendo, a sensação de novidade sempre ficava a cargo do Goku.

Enma Daioh, o infinito Caminho da Serpente, o inferno e, por fim, o Senhor Kaio.

Cara, o universo de DBZ foi expandido pela primeira vez através dos olhos do Goku. Ele pode estar morto, fora do campo de batalha, mas é por ele que somos apresentados aos novos conceitos que o autor desenvolve.

E por falar em estar fora do campo de batalha, o autor trabalha repetidas vezes com o sentimento de urgência. Dessa maneira temos o Goku, aquele que está sempre atrasado.

Essa é uma manobra interessante adotada pelo autor. Ele apresenta os novos personagens, oferece a carga dramática necessária, o “tempo de tela” para que cada um brilhe dentro do seu potencial para, enfim, retornar com seu protagonista.

É criado um balanço. A participação efetiva do Goku diminui ao mesmo tempo que sua importância aumenta.

Corta para Vegeta e Nappa e o primeiro sentimento de urgência.

E pensar que só dois, dos três baixinhos, sobrevivem para contar história

Goku é ressuscitado e tem que voltar às pressas para a Terra, percorrendo todo o Caminho da Serpente. A gente sabe que ele está ali, acompanhando tudo. Nesse ponto, o Goku é um espectador como a gente em por conta disso, sofre com cada amigo caído no campo de batalha.

Corta para as Forças Especiais Ginyu e o segundo sentimento de urgência.

Eles deram trabalho, é sério

Vegeta, Kuririn, Gohan, Dende. Estão todos ali, enfrentando a tropa de elite do imperador Freeza. Estão em desvantagem, o inimigo é superior em todos os quesitos. Nosso protagonista, por conta da batalha cruel contra Vegeta, será o último a chegar ao Planeta Namek e, por conta disso, tudo que lhe resta é torcer para que todos aguentem um pouco mais.

Corta para o Freeza e o terceiro sentimento de urgência.

Vegeta coloca o Goku numa espécie de câmara de recuperação, devido a última batalha contra o Capitão Ginyu. Lá daquela câmara, Goku acompanha, pelo ki, todas as transformações de Freeza, as chegadas dos antigos companheiros, como o Piccolo e o desenrolar de todas as batalhas. Ele está se recuperando, sabe que precisa se recuperar se quiser ajudar a todos. Então, o que lhe resta é torcer para que seus amigos estejam inteiros quando chegar.

Veja como o Akira Toriyama “humaniza” o Goku nesses pontos do anime. Seu principal protagonista, seu ás na manga, é colocado no mesmo papel do espectador. Da mesma maneira que, do outro lado da telinha, somos incapazes de interferir na luta, sendo obrigado a ver os inimigos derrubando, um a um, todos aqueles personagens que nos cativaram. Goku é colocado nesse mesmo patamar, bem ao nosso lado.

Assim, o Goku sofre como a gente. Dessa maneira, nos identificamos com todos os anseios, frustrações e sentimento de incapacidade que o Goku demonstra. E é exatamente por conta disso, por sermos as únicas pessoas, no momento, a entendê-lo, que torcemos, mais do que nunca, para que ele chegue logo.

Mais um ponto para o nosso Akira Toriyama, que fecha o desenvolvimento do protagonismo do seu personagem logo a seguir.

Quando tudo parece estar perdido, temos o Lendário Supersayajin

Aqui é o famoso gran finale! para o desenvolvimento do protagonismo do Goku ao longo de toda a saga do DBZ.

Até aqui a gente se acompanhou a nova fase do Goku, suas novas descobertas, a expansão do universo aos seus olhos, a criação do sentimento de urgência e a identificação com seus medos e anseios.

A cereja do bolo virá com a confirmação de que ele é o herói que a gente tanto espera. Aquele ser responsável por nos dar esperança quando tudo parece estar perdido, somente com a sua presença.

sentimento de esperança e alívio só existe graças ao sentimento de urgência que o autor desenvolveu em nós. Isso faz com que acreditamos nele, a ponto de erguer as mãos para a Genki Dama.

Aqui cabe uma consideração: o próprio desenvolvimento da Genki Dama. Ela só é possível graças a ajuda de todos os seres vivos. É o aviso de que “sem a gente, ele não conseguiria vencer”. Talvez a Genki Dama seja o ponto máximo de identificação que temos com o Goku porque literalmente (por que não?) um pouco de nós está com ele naquela decisão.

Porém, o Freeza não é derrotado. Nem mesmo com a nossa ajuda. E agora?

Nesse momento, Akira Toriyama retribui toda a nossa fé no personagem,  presenteando-nos com mais uma invertida nas expectativas. Ele nos apresenta o SuperSayajin. O aviso máximo de que, por não desistirmos do Goku, ele não desistirá de nós.

Novamente, nosso sentimento de esperança é despertado graças ao sentimento de urgência. Por que na última hora? Porque depois da Genki Dama?

Porque era necessário para o personagem passar por tudo isso.

Ele não precisa ficar no centro de tudo pra sabermos que ele é o centro do anime

Quando tudo parece estar perdido, com o planeta a ponto de ser destruído e com todos os heróis caídos, é nesse momento que o último passo tem que ser dado, a confirmação da crença no próprio protagonismo.

E é isso que acontece. Temos o Lendário SuperSayajin bem na nossa frente, mais preparado do que nunca. Tudo isso porque foi necessário todo o preparo anteriormente apresentado, para que ele pudesse chegar onde chegou.

É a nossa recompensa a solidificação máxima de que o Goku é o protagonista do desenho, tendo todo o seu caminho de autoconhecimento calcado. É a tal da jornada do herói.

Akira Toriyama, Goku e os aplausos

É bem nessa parte que a gente aplaude o Akira Toriyama por ter desenvolvido uma nova camada para o personagem. Não à toa, nos identificamos com o Goku.

Sim, é esse carinha que a gente tem a agradecer

Fica claro que na saga DBZ, mais do que nunca, foi trabalhado para que conheçamos aquele personagem que, tempos atrás, percorreu o mundo numa motocicleta, junto com uma garota de cabelo azul, atrás das sete esferas do dragão.

A gente tem muito papo pra bater sobre esse anime. Quero muito falar sobre o Piccolo e o povo de NamekO Ápice e a Decadência do Gohan ou a Importância do Vegeta, o Mais Importante Coadjuvante da História.

Mas,por hora quero, revisitar alguns episódios e agradecer a aula que o Akira Toriyama proporcionou sobre como se constrói e solidifica o protagonismo de um personagem.

Abraços.

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