A gente conhece mais ou menos a história.

Trompete azul, robô canadense, ternos, gravata de pato, atravessar o estado em busca de um pedaço de pizza no Fiero ao som de The Proclaimers — I’m Gonna Be (500 miles), aquela música que costuma se tornar boa no decorrer das vezes que a ouve, poemas do Pablo Neruda, um baixo afinado, a certeza que banda é sempre melhor que DJ em uma festa de casamento, o guarda-chuva amarelo.

E também todas as suas regras e teorias. O gráfico da Gostosa x LoucaTeoria da Líder de Torcida, a Regra de Platina, a Regra dos Gremlins para descobrir se está em um relacionamento, a Regra dos Três Dias.

Talvez, bem talvez, How I Met Your Mother seja melhor que Friends.

“Nove anos pai. Nove anos! Espero que o final seja fantástico, e já nem ligo mais se tiver uma mentira ou outra.”

E temos todas essas informações e certezas através dos olhos do Ted Mosby. O que me faz desconfiar que, literalmente ou figurativamente, tudo que vemos e ouvimos sobre a versão dos fatos é de acordo com a visão dele.

Pera lá, não tô duvidando dele. Na verdade, não duvido de ninguém. Mas um tal de Doutor House, aquele cara que usava uma bengala, terno, jeans e tênis, já ventilava por todos os cantos do Princeton-Plainsboro Teaching Hospital que todo mundo mente.

Isso mesmo.

Todo mundo mente.

“Como assim vocês não se lembram do nosso musical, quando eu havia dito para aquela mulher que eu preferia o terno a ela? Foi exatamente assim que aconteceu!”

E olha, esse arquiteto mente bem. Mente tão bem quanto os seus amigos. E você sabe, mentira boa é aquela que vai aumentando de proporção à medida que ela é contada, até parecer verdade, por mais que custe acreditar.

E aqui vai uma dica em primeira mão. Desconfie de todo livro ou filme que é narrado em primeira pessoa. Somos apresentados para somente um lado da história que é falada de uma maneira tendenciosamente exagerada.

Seria a mesma coisa de você me contar daquela vez que quase arrumou briga quando te empurraram no corredor do metrô e só não fez porque os seguranças o separaram, para sorte da outra pessoa.

Mas então você me pergunta, porque o Ted precisa mentir?

Vocês não estão entendendo. O que estou falando aconteceu mesmo.”

Bem, primeiro porque ele está contando a jornada de como conheceu sua esposa para os filhos de quinze, dezesseis anos e, como todo um pai, é bem melhor dar aquela amenizada em alguns fatos, como os sanduíches, os jogos de tabuleiro do pai da Lily, ou o som estridente daquelas gaitas de fole que os vizinhos do andar de cima tocavam.

O outro motivo que o faz mentir tão bem é que ele é exatamente como você. Quer dizer, todos os amigos deles também são assim. Cada história que ele diz sobre cada integrante da sua gangue nada mais é do que seu ponto de vista sobre o ponto de vista da história contada por cada um deles.

Veja só, a Robin esconde do Ted o fato de ser simpatizante de armas de fogo, como também demora quase uns vinte anos para contar a Lily que havia deixado o pequeno Marvin sob o cuidado do Mike Tyson numa boate de striptease.

Antes de considerar a Lily uma vítima, lembre que não foi tanto uma obra do acaso ela ter batido exatamente no quarto do Ted e do Marshall em busca de alguém para consertar seu rádio. O rádio não estava quebrado e aquela não havia sido a primeira porta batida.

“Sente-se e, se quiser, beba alguma coisa. Detectamos a necessidade de uma pequena intervenção nas suas histórias.”

Antes que sintam pena do Marshall, lembrem que ele fez os outros concordarem em mentir para a Lily, quando a mesma acreditava que finalmente havia encontrado o Doppelgänger do Barney, uma vez que ela tinha feito um pacto com o Marshall de engravidar somente depois de encontrar o último Doppelgänger da gangue.

Não se esqueçam da dúvida plantada na cabeça de todos quando Marshall diz que foi assaltado em um zoológico por um macaco, com o intuito de não deixar sua esposa apavorada.

A essa altura do campeonato, nem seria mais necessário falar do mais mentiroso de todos, Barney Stinson, certo? Ele jurava de pés juntos, ser o filho do apresentador Bob Parker, do programa The Price is Right, assim como convenceu o Ted a simular uma briga para conseguirem conquistar mulheres, em especial a Robin, invertia todas as possibilidades de sucesso de 17% para 83%, e, junto com a Robin, escondeu da gangue seu relacionamento com ela durante todo o verão.

“Quem disse que havia álcool na minha bebida? No amor, na guerra e para ver os peitos da Lily, vale tudo.”

E muito disso se deve à criação que ele e o James tiveram de sua mãe, que encontrava nas histórias contadas, um meio de fazer com que os filhos se sintam seguros sem a presença paterna.

Nesse momento, o médico barbudo com um cappuccino na mão já nem se importa mais em provar seu ponto de vista.

Todo mundo mente.

Vamos lá, aceite isso.

Você pode mentir para tirar vantagem de uma situação, assim como Brad fez com o Marshall, para defender sua empresa acusada de danos ambientais.

Você também pode mentir para mostrar a seu amigo que nem tudo está perdido, como Barney fez com o Ted, mostrando que ser arquiteto não é a pior coisa do mundo, sendo possível até conquistar algumas mulheres.

“Tá vendo porque é sempre bom uma mentira do que descobrir que a Nora se parece com a nossa mãe?”

Você pode mentir para provar seu ponto de vista, assim como Marshall e o Barney fizeram, logo que desconfiaram que o Ted não respeitaria a regra de três dias e retornaria a ligação para a mulher. Como também pode mentir para punir seus amigos, assim como Ted fez com o Marshall e com o Barney, quando descobriu que eles eram a garota das mensagens.

Caso queira demonstrar seu amor por outra pessoa, você pode agir assim como a Stella agiu com o Ted, dizendo que gostou de Star Wars, ao saber que isso significava muito para ele.

Claro, se a sua intenção na vida é ganhar dinheiro, que tal fazer como o Tony e produzir dois filmes A noiva do Casamento A noiva do Casamento 2, para arrecadar milhões?

“Aqueles últimos cinco minutos da série simplesmente não existem. Esse é o verdadeiro final dela.”

Em meio a tantas histórias, How I Met Your Mother tem como o seu maior triunfo a honestidade ao dizer que, vira e mexe, conta uma mentira de leve para a gente.

Por isso, sente-se, que vou lhe contar uma história incrível.

Prometo que não vou mentir muito.

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