Não, definitivamente não. Não basta completar 18 anos, sair para comemorar e ter a primeira ressaca da vida. Não basta tirar carta de motorista, aprender a se barbear, começar um trampo novo no centro da cidade.

Não basta nada disso para nos vangloriarmos como seres racionais — ou emotivos — adultos. Descobri que falta a peça chave nisso tudo, caro leitor. Um detalhe que não é azul ou tangível — talvez toque lá dentro, como toca.

O fato é que fui finalmente lembrado e presenteado com a cereja do bolo. Descobri recentemente, ao passar no gastro — um japonês com cara de poucos amigos e que fala vagarosamente somente o necessário, olhando por cima dos óculos fundo de garrafa de armação fina — o médico disse sem rodeios, confetes e bolo de chocolate:

— Você possui uma gastrite erosiva discreta — como o dono — de antro e uma úlcera antral em cicratização — enalteceu um pouco a voz, que continuava lenta e mórbida.

Após a fala, percebi a alegria contida nos olhos puxados do médico. Não é todo dia que ele apadrinha um adulto recém-formado. Os olhos puxados retornaram para a direção do monitor do computador e o gastro começou a digitar uma dieta alimentar e receita de remédio caríssimo.

O resultado foi esse: dois antibióticos e um para reduzir o dano dos dois ditos antibióticos no meu corpo. O médico completou dizendo que no início eu poderia sentir um gosto metálico na boca e isso era tão normal quanto pegar um congestionamento na cidade dos congestionamentos — incluo a de nariz nisso também. Na hora da receita alimentar, li pausadamente cada tópico minúsculo da folha, fazendo alguns apontamentos:

Não como muita fritura

Não como rápido — rápido como uma tartaruga, utilizando-se de metáfora.

Não tomo refrigerante durante a semana

Não sinto ansiedade e nem me estres…

Perguntei ao japonês se ansiedade e stress contribuíam para a dita gastrite. O médico afirmou com a cabeça, tendo um pouco de dificuldade por conta do pescoço curto que ligava a cabeça ao restante do corpo, que a dupla dinâmica podia sim contribuir. Inocente, perguntei o que então a minha pessoa poderia fazer para melhorar isso tudo. O médico respondeu à pergunta de forma óbvia:

— Apenas não se estresse e não fique ansioso.

Retruquei dizendo que era praticamente impossível não se estressar ou ficar ansioso nos dias atuais em São Paulo. O médico forçou um riso e finalizou o atendimento dizendo:

— Bem-vindo à vida de adulto. Apenas tente, senhor — o sorriso de canto por ter presenteado um adulto recém descoberto ainda estava em seu rosto.

Agora estou aqui. Um adulto completo, graduado e pós graduado na vida. Agora compreendo por que em São Paulo está infestado de adultos por todos os cantos do concreto. São tempos modernos — e retrógrados. Aguardemos a próxima geração — que não vai mais ser Coca-Cola, porque refrigerante ataca a gastrite.

(Ainda não comprei os remédios)

(Minha gastrite de estimação manda lembranças)

(A úlcera está de repouso por tempo indeterminado, mas ama todos vocês e não vê a hora de ver cada um face a face)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *